Hora certa!

00:00:00

sexta-feira, 20 de março de 2009

Pagu, A Mulher.

NOTHING

Nada nada nada
Nada mais do que nada
Porque vocês querem que exista apenas o nada
Pois existe o só nada
Um pára-brisa partido uma perna quebrada
O nada
Fisionomias massacradas
Tipóias em meus amigos
Portas arrombadas
Abertas para o nada
Um choro de criança
Uma lágrima de mulher à-toa
Que quer dizer nada
Um quarto meio escuro
Com um abajur quebrado
Meninas que dançavam
Que conversavam
Nada
Um copo de conhaque
Um teatro
Um precipício
Talvez o precipício queira dizer nada
Uma carteirinha de travel's check
Uma partida for two nada
Trouxeram-me camélias brancas e vermelhas
Uma linda criança sorriu-me quando eu a abraçava
Um cão rosnava na minha estrada
Um papagaio falava coisas tão engraçadas
Pastorinhas entraram em meu caminho
Num samba morenamente cadenciado
Abri o meu abraço aos amigos de sempre
Poetas compareceram
Alguns escritores
Gente de teatro
Birutas no aeroporto
E nada.

Pagu/Patricia Rehder Galvão
Publicado n'A Tribuna, Santos/SP, em 23/09/1962.


Patrícia, a PAGU, nasceu na cidade de São João da Boa Vista, no dia 14 de junho de 1910 às 2 horas da tarde, na casa nº 21 da antiga Rua São João (hoje Getúlio Vargas). A casa onde nasceu Patrícia embora construída de taipa e barro sovado, era sólida e de boa aparência. Depois de reconstruída, o Sr. Antônio Balestrin passou a residir ali com a família, instalando nela inclusive, sua fábrica de móveis. Patrícia era filha do Dr.Thiers Galvão de França, advogado e jornalista e de Adélia Rehder Galvão, filha da tradicional família Rehder. Foram seus avós paternos Joaquim Galvão Freire de França e Guilhermina Galvão e avós maternos Germano Rehder Sobrinho e Ordália Aguiar Rehder. Dr.Thiers e D.Adélia casaram-se em 1902, ele com 28 anos e ela com 18 anos. Dessa união nasceram 4 filhos: Conceição, Homero, Patrícia e Sidéria. A última nasceu quando a família já morava em São Paulo.

1930. Casa com Oswald. Nasce Rudá de Andrade.

Pague Oswald se casaram em janeiro de 1930. Rudá nasceu em 25 de setembro de 1930. A Pagu já tinha então algumas experiências de comunismo e quem cuidou do bebê foi uma enfermeira do Hospital chamada Lúcia, que foi levada pra casa dela e virou comunista também e mais tarde ficou presa com ela. Em março de 1931 fundam o jornal tablóide "O Homem do Povo". O jornal, no qual Pagu escrevia artigos, fazia desenhos, charges e vinhetas, além de assinar a seção "A Mulher do Povo" em que criticava as feministas da elite e as classes dominantes, durou apenas oito números, tendo sua circulação sendo impedida pela polícia. A experiência no jornal O Homem do Povo rendera a Pagu a condenação de dois anos de prisão, evitados com uma fuga para a Argentina. Pagu encontrou-se com Luis Carlos Prestes, também refugiado em Buenos Aires, em 1930. “Um aspecto curioso é que nos encontramos num bar e, sem sair da mesa, conversamos durante 48 horas”, exagera Pagu. Para ela essa conversa foi decisiva. Pagu já é militante. Na volta ao Brasil,em dezembro em 1930, filia-se ao Partido Comunista.

1931. Pagu e Oswald editam o Jornal HOMEM DO POVO.

Oswald e Pagu passaram a editar o jornal O HOMEM DO POVO, a tribuna para os seus disparos irreverentes. Imprensa nanica que utilizava-se de uma linguagem ferina e bem humorada, tratando com humor e sem piedade, temas e pessoas evidentes no cenário político, religioso e social. Este pasquim teve uma vida curta, de apenas oito edições. Pagu colaborava com cartoons, tiras de humor, opinava nas revoluções gráficas e assinava a coluna A MULHER DO POVO, onde exercitava a polêmica, utilizando como pano de fundo pensamento marxista, como na 1ª edição de 17 de março de 1931, quando escreveu o artigo Maltus Além, trocadilho com Matusalém, o ancião da Bíblia e as pregações celibatárias do pastor Maltus. Pagu criticava, no artigo, o feminismo em nome do materialismo histórico e defendia a vinculação das reivindicações feministas a uma transformação global das relações sociais, já que eram as condições mentais e materiais da sociedade que vinculavam a figura da mulher a uma suposta inferioridade. A irreverência de O HOMEM DO POVO foi a responsável pelo seu próprio, fim. Oswald, ex-aluno da Escola de Direito do Largo de São Francisco, em artigo, denominou esta tradicional instituição de ensino como um “cancro que mina o nosso estado”. Após esta declaração, os estudantes empastelaram o jornal.

Em Santos, Pagu é presa pela primeira vez.

Em agosto de 1931, como militante comunista, Pagu participa do comício do Partido e dos estivadores em Santos, na Praça da República. Escolhida como principal oradora , ela é agarrada por policiais, que tentam amordaçá-la. O estivador negro Herculano de Souza vai em sua defesa, é baleadoe ela levanta do chão sua cabeça ensangüentada. Ele morre em seu colo. Pagu é presa e levada ao cárcere 3, na Praça dos Andradas, considerada a “pior cadeia do continente”, onde permanece duas semanas. Transforma-se assim na primeira mulher presa no Brasil por militância política.

O apelido Pagu foi dado por Raul Bopp,teria mostrado a Raul alguns poemas e, na mesma ocasião, o poeta sugeriu que ela adotasse um “nome de guerra” literário. Sugeriu Pagu, brincando com as sílabas do nome da escritora, que Bopp equivocadamente acreditava se chamar Patrícia Goulart.

COCO DE PAGU
(Raul Bopp)

Pagu tem os olhos moles
uns olhos de fazer doer.
Bate-coco quando passa.
Coração pega a bater.

Eh Pagu eh!
Dói porque é bom de fazer doer.

Passa e me puxa com os olhos
provocantissimamente.
Mexe-mexe bamboleia
pra mexer com toda gente.

Eh Pagu eh!
Dói porque é bom de fazer doer.

Toda a gente fica olhando
o seu corpinho de vai-e-vem
umbilical e molengo
de não-sei-o-que-é-que-tem.

Eh Pagu eh!
Dói porque é bom de fazer doer.

Quero porque te quero.
Nas formas do bem-querer.
Querzinho de ficar junto
que é bom de fazer doer.

Eh Pagu eh!
Dói porque é bom de fazer doer.

Por seu ideal político, foi presa mais de 20 vezes!

12 de dezembro de 1962. Morre Patrícia Rehder Galvão - a Pagu

“Deu-se esta semana uma baixa nas fileiras de um agrupamento de raros combatentes. Ausência desde 12 de dezembro de 1962, que pede seu registro do companheiro humilde, que assina estas linhas. Patrícia Galvão morreu neste dia de primavera, nessa quarta-feira, às 16 horas (...) Morreu aqui em Santos, a cidade que mais amava, na casa dos seus, entre a Irmã e a Mãe que a acompanhavam, naquele momento e, felizmente, em poucos minutos, apenas sufocada pelo colapso que a impedia de respirar, pela última palavra que pedia ainda liberdade, ‘desabotoa-me esta gola’”. (Geraldo Ferraz, A Tribuna, 16/12/1962).

Depoimentos sobre Pagu

"Dentro desta mulher, longe de condicionamentos e repressões estéticas, literárias, sexuais, sociais e culturais, topamos com a leveza dos traços, quase infantis, característicos de uma Arte Moderna, que retratam a sensibilidade de sua alma".

Maria Lúcia Teixeira Furlani

“Pagu foi pioneira nas ideias e na ação, transcendeu seu tempo, por ousar sofreu, sentiu ostracismo, foi perseguida, presa, torturada, não se vergou, não se entregou. Somente a doença venceu-a. A vida do espírito, porém, desconhece a morte. Fez história. É sanjoanense.”

Maria Célia Campos Marcondes.

http://www.mulheresdesaojoao.com.br/site/pagu_biografia.php - acessado 20/03/09.

Nenhum comentário: