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domingo, 27 de abril de 2014

Avaliação: estudos e debates constantes


“A avaliação escolar tem se configurado nas escolas como uma prática de exclusão, classificação e controle, utilizando-se de uma prática pedagógica polarizada com provas e testes, os quais identificam apenas o conhecimento que o aluno já possui, não se preocupando com as possibilidades do que esse pode aprender através da mediação do professor”.

Constata-se que muitas vezes o insucesso do aluno em fazer tarefas ou provas, atribui-se à falta de conhecimento de princípios envolvidos na operação, ou, ainda, a uma baixa inteligência que impede a compreensão desses princípios. O que é ignorado na maioria dos casos é que a deficiência pode residir não no nível operacional ou em um conteúdo específico do processo de pensamento da criança, mas nas funções cognitivas que formam a base na qual se apoia uma performance bem sucedida e que alicerçam as operações cognitivas.
A ideia de avaliar para medir mudanças comportamentais e a aprendizagem, portanto, para quantificar resultados, encontra-se apoiada na racionalidade instrumental preconizada pelo Positivismo. Concepções sobre Avaliação. Mary Stela Ferreira Chueiri. Psicóloga Escolar.
Para Feuerstein, “de maneira semelhante ao que preconiza Vygotsky, o processo de avaliação deve ter como objetivo desvendar o potencial de aprendizagem do sujeito e não apenas identificar que conhecimento já possui naquele momento determinado”. Feuerstein et al. 1993.
Acredita-se que apesar de estudos sobre avaliação, provavelmente, não se sabe avaliar de acordo com as teorias, na concepção de professores porque as teorias nem sempre podem ser subsídios para a prática. A realidade das escolas suplantam as teorias. Mesmo porque os que escrevem as teorias não as aplicam nas escolas juntamente com os professores.
Debatem-se, por isso, constantemente, nos cursos de aperfeiçoamento, reuniões pedagógicas e conselhos de classe como realizar uma avaliação que não seja classificatória e excluente, embora a atribuição de notas persista na escola para “medir” o conhecimento do aluno, desde a Idade Média.
Entra nesse contexto a avaliação formativa onde a “atribuição de notas não é um problema porque essa avaliação não ocupa lugar - trata-se de um parâmetro, decorrência do processo.” Elisabete, Avaliar o tempo todo. Nova Escola, p.33.
A avaliação processual, isto é, contínua “permite acompanhar a construção do conhecimento, identificar eventuais problemas e dificuldades e corrigi-los antes de avançar”. Isso “ajuda a interpretar o que a turma aprendeu ou, não, e, assim, intervir, mudando as estratégias”. Jussara Hoffmann, Avaliar o tempo todo, Nova Escola, p.33.
            Por outro lado, esse tipo de avaliação é difícil para certos professores devido a várias causas: falta de preparo para uma avaliação diferenciada, persistência nas avaliações tradicionais, as mais comuns, perguntas e respostas, questões de completar, assinalar certo ou errado; cópia e cola de exercícios dos manuais didáticos ou sites da internet, questões descontextualizadas e mal elaboradas, sem relação com objetivos planejados, falta de conhecimento para avaliar os objetivos do conteúdo, resistência às novas propostas de avaliação, etc.
            O mais difícil na escola é quando o professor utiliza esse tipo de prova como instrumento de poder e deixa para o aluno a responsabilidade pelo resultado. Ainda bem que não é regra na maioria das escolas.
            No Plano de Trabalho Docente, todavia, elaboram-se a princípio, objetivos para que se possa avaliar e “verificar” se o aluno os atingiu durante o percurso através de diferentes instrumentos. E planeja-se a recuperação(direito do aluno), sob vários critérios. 
 Afirma-se, ainda que, os objetivos nem sempre podem ser avaliados e recuperados, pois cada aluno está numa etapa da aprendizagem. E a duração proposta pelo calendário, isto é, o tempo que lhe é dado para se atribuir uma nota, não condiz com o tempo de aprendizagem do discente.
 Este é um motivo importante que requer a avaliação contínua para que a exclusão não comece com os instrumentos mais utilizados em sala de aula: provas.

            Enfim, a aprendizagem do aluno pode estar aliada a vários fatores onde os mesmos podem ser influenciados por diversos fatores, uns de responsabilidade do professor – domínio do conteúdo, metodologia e  instrumentos.  Outros, “fogem” de sua alçada: não comparecimento às aulas, “desleixo” e pouca vontade de aprender. Tais questões contribuem para a dificuldade de avaliar também de forma processual. São entraves que a escola deve superar de acordo com sua realidade porque a avaliação é um processo que interessa a todos, na escola. É um processo coletivo entre professor, conhecimento e sujeito do conhecimento.

domingo, 20 de abril de 2014

As rainhas do lar

Crônica



            Ao sairmos da sala onde houve discussão sobre o gerenciamento da família e, consequentemente, dos filhos, percebeu-se que a tarefa ainda é árdua para muitas mulheres, apesar de estarmos no século XXI.
            Postamo-nos incrédulas, na situação apresentada sobre o comentário de uma delas do quanto se sentia em dificuldade para equilibrar o trabalho que exercia fora do lar e seus “deveres de dona de casa”. Marido e filhos não lhes davam descanso. Nada de colaboração no lar: porque homens não podem fazer nenhuma tarefa doméstica. “Isto é coisa de mulher”.
            Segundo a Psicóloga Lígia Guerra “muitas vezes a própria mulher colabora para este conceito, pois faz distinção em casa entre as tarefas dos meninos e das meninas”. Meninas ajudam a lavar a louça, limpar a casa, etc., meninos ficam na sala com o pai vendo televisão ou jogando vídeo game.
            Dias atrás um aluno me falou: “lá em casa, minhas irmãs são da mãe; eu e meus irmãos somos do pai. - É assim pedagoga, vamos “co” pai ao futebol e pescar. A mãe vai passear “co as” meninas no shopping e fazer as unhas. Suspirei. E empreendi uma conversa X. Outro me disse: “Minha mãe não trabalha”. Como assim, interpelei. – “Ela cuida da casa e faz comida”. Mais um: - Ah, pedagoga, “minha mãe, não faz nada”. Só dorme no sofá. “Nós temos que fazer o serviço”. – Verdade? Explique-me: - “tenho um irmão que”... bem, a mãe não consegue dormir à noite pra cuidar dele”.
Esses depoimentos são fictícios, mas servem para ilustrar os acontecimentos de algumas realidades presentes nas famílias e da mulher mãe.
            Atualmente ainda perduram “as rainhas do lar”, expressão que surgiu durante o século XVII entre a burguesia.  Resgatei-a desses velhos tempos em que a mãe era submissa ao marido e nem tinha direito de amamentar os filhos. E a trouxe para o tempo que a família era a “célula da sociedade”, conceito empregado nos livros de Educação Moral e Cívica, 1969, em pleno regime militar. (Em 1970, disciplina obrigatória nas 5ªs e 6ªs séries do curso ginasial).  A mãe, batalhadora por seus direitos no mercado de trabalho, mas tímida e ainda submissa e responsável de educar e ensinar os filhos - encontrava-se encarcerada -, embora já se estivessem “queimados os sutiãs em praça pública”, e a pílula surgira milagrosamente como sinônimo de liberação sexual e controle da natalidade.  A onda do feminismo(movimento social, filosófico e político queria libertar a mulher de padrões opressores baseados em normas de gênero.  O pai, historicamente, figura austera cujo papel era impor sua vontade e por ordem no lar, paralisou-se por alguns tempos na sociedade, isto é, descaracterizou-se, frente a essa nova realidade aos moldes femininos, cuja primeira onda teria ocorrido no século XIX e início do século XX, a segunda nas décadas de 1960 e 1970 e a terceira da década de 1990 até a atualidade. (Wikipédia. A enciclopédia livre).
            Após as reflexões históricas já conhecidas, volto à personagem que me fez escrever esta crônica. As mulheres presentes no momento das considerações se voltaram imediatamente ao “pobre”. E as análises e conceitos surgiram.
 Mas, a coisa cheia de graça realmente aconteceu quando após a reunião, cada uma compara o próprio marido com o da outra em relação ao esposo da minha personagem. Maridos mais ou menos maravilhosos devido a este ou aquele desempenho doméstico, eram enumerados. E consideraram-se as bem-amadas profissionalizadas.  Os risos se sucederam...  Já não são “Amélias” (?!).
Imagine leitor, eu, solteira, no meio de tantos risos e agraciamento das bem-casadas. Sorriso a meia boca, sem graça, ria não sei de quê.  Na verdade uma anônima ali, circunstancialmente.   Meio sem graça, disse-lhes: - “Meu pai quando nasci dispensou “a comadre” que vinha dar banho em mim. - “eu mesmo banho minha filha”... E tomou conta da casa, da mulher e da filha, isto em 1952.

Saí de fininho da sala, pois todas se divertiam com seus próprios comentários sobre os cônjuges bem-amados e não machistas, as rainhas do lar, as bem-amadas. Quem iria dar atenção às colocações de uma mulher solteira - por opção - sobre as qualidades de um homem – pai, além do seu tempo?     

quinta-feira, 3 de abril de 2014

O morto


O pobre homem jazia esquelético e pálido
na caixa eterna.
No rosto e mãos entrelaçadas a cor da morte.
Apesar do sofrimento que tivera em vida para deixar esta existência
Mostrava- se calmo, enigmático.

Na sala do morto os vivos disfarçam o medo e a incredulidade: do fim.
Sorrisos abafados, conversas a meia voz, olhares pra este ou aquele.
Um entra e sai consternado; as lágrimas nos olhos dos mais chegados.
As rezadeiras rezam as orações encomendando o morto a Deus.
O silêncio é rompido pelos lamentos e lágrimas de quem amou aquele
que jazz na caixa eterna dali a pouco na terra fria.

Benzem-se os vivos frente ao morto em sinal de respeito, cabisbaixos.
Afinal, ele merece o gesto: viveu a vida terrena e se encaminhou para o eterno.
E os vivos se perguntam frente ao defunto – quando será minha vez?


Lembranças de uma menina no Regime Militar

                Mês de março no Brasil é tempo de relembrar principalmente os erros da ditadura militar a partir de 1964. Os escândalos atuais têm alguma relação de imposição e desfaçatez, na atual democracia pela qual se lutou tanto e alguns até deram sua vida pelos ideais que acreditavam: políticos, sociológicos, filosóficos, etc. Algumas pessoas permanecem desconhecidas na luta por um país democrático e outras lutam no dia a dia para que o país continue democrático.
                Alguns brasileiros se importam com a história da sua Pátria, outros, não aprenderam a valorizar a terra tupiniquim. De quem é a culpa? Não é tema para discutir-se neste texto, pois quero reportar-me ao dia 31 de março de 1964, 50 anos atrás, e contar-lhes um pouco sobre esta data, cujos acontecimentos até hoje são importantes para a história do nosso país. Já foi considerado feriado e comemorado na escola com hinos e versos.
Dia 31 de março de 1964 estávamos de viagem de Curitiba à Pranchita.  Fomos pegos de surpresa pelo “golpe militar” deflagrado na madrugada.
 Ao chegar a Pato Branco, meu pai, João, soldado da Polícia Militar, transferido, ficou à disposição no quartel obrigatoriamente.  Passamos à noite num hotel e de manhã, ele nos colocou no ônibus da empresa Kovaleski. Seguimos viagem chorando por deixá-lo, agarrados à saia da mãe, que temerosa, não entendia o que estava acontecendo, pois o comentário era de que “estourara uma guerra no Brasil”. Polícia e sirene para todo lado anunciava que nada estava bem. Nossos olhos curiosos perscrutavam pela vidraça embaçada o silêncio.  Ninguém nas ruas de Pato Branco. Casas fechadas.  Durante a viagem, em cada rodoviária, ouvia-se o rádio para saber o desenrolar dos acontecimentos.  Silêncio entre os passageiros, afinal nem sabiam o que estava acontecendo. Um comentário em voz baixa aqui, outro acolá.
 Chegamos a Pranchita. Subimos o que hoje é a rua principal arrastando as malas até a casa da “comadre Zelinda, do Russo”, madrinha do meu irmão menor. Outra história de outro tempo que lá moramos em 1958-1960. D. Zelinda matou a fome das crianças e nos dirigimos à casa do soldado Gilberto para pouso. Nesse tempo as pessoas eram solidárias, como D. Zelinda que nos recebeu de surpresa. Os policiais repartiam sua casa com outros policiais porque todos eram jogados de um lado para outro, de acordo com as necessidades das cidades. Menos se observava as dos próprios policiais.
 Assim foi nossa vida de crianças e adolescentes. Nenhum policial da época da ditadura contestava. Apenas recebiam ordens dos comandantes e as cumpriam.  Ninguém ousava desrespeitá-los porque sua conduta era impecável.  Nada de corrupção. Um pequeno erro era cadeia e expulsão na certa. Exalto meu pai e colegas de farda que foram policiais de renome.
Avançando um pouco me vejo professora aqui em Marmeleiro nesse período.  Os professores tinham de buscar permissão em Curitiba no DOPS para poder lecionar, isto é, comprovar que nenhum era comunista e tinha ideias revolucionárias.
Professora de Ensino Religioso nos Colégios Estaduais de Marmeleiro, inocente, moça nova, cheia de sonhos e crenças na humanidade, ex-moradora da capital, que amava viajar, enfim, pessoa ideal para representar os colegas.  Documentos em mãos solicitados pelo DOPS que comprovavam a idoneidade de todos, viajei. 
A fila que antecedia o DOPS dobrava quarteirões diariamente.  Primeiro dia, segundo dia, terceiro dia lá estava eu às 6 horas. Somente no quarto dia consegui entregar os documentos para a pessoa na recepção que olhava e rabiscava as folhas com cara feia e ares de mofa.  Liberada, voltei com as cópias em mãos que permitiam aos professores lecionar. Aqui já pensavam que eu tinha sido abduzida pelo regime, apesar de ser filha de militar.
Ah! Esqueci-me de dizer que só no terceiro dia alguém se dignou no DOPS separar os professores do interior e das capitais para agilizar o procedimento e que me ofereci para representar os colegas. O ano? Talvez, 1969. Fui estudante e professora nessa época, mas esta é outra história.

Publicado no Jornal de Beltrão, domingo, 30.04, p.3.