Mês
de março no Brasil é tempo de relembrar principalmente os erros da ditadura
militar a partir de 1964. Os escândalos atuais têm alguma relação de imposição
e desfaçatez, na atual democracia pela qual se lutou tanto e alguns até deram
sua vida pelos ideais que acreditavam: políticos, sociológicos, filosóficos,
etc. Algumas pessoas permanecem desconhecidas na luta por um país democrático e
outras lutam no dia a dia para que o país continue democrático.
Alguns
brasileiros se importam com a história da sua Pátria, outros, não aprenderam a
valorizar a terra tupiniquim. De quem é a culpa? Não é tema para discutir-se
neste texto, pois quero reportar-me ao dia 31 de março de 1964, 50 anos atrás,
e contar-lhes um pouco sobre esta data, cujos acontecimentos até hoje são
importantes para a história do nosso país. Já foi considerado feriado e
comemorado na escola com hinos e versos.
Dia 31 de
março de 1964 estávamos de viagem de Curitiba à Pranchita. Fomos pegos de surpresa pelo “golpe militar”
deflagrado na madrugada.
Ao chegar a Pato Branco, meu pai, João,
soldado da Polícia Militar, transferido, ficou à disposição no quartel
obrigatoriamente. Passamos à noite num
hotel e de manhã, ele nos colocou no ônibus da empresa Kovaleski. Seguimos
viagem chorando por deixá-lo, agarrados à saia da mãe, que temerosa, não
entendia o que estava acontecendo, pois o comentário era de que “estourara uma
guerra no Brasil”. Polícia e sirene para todo lado anunciava que nada estava
bem. Nossos olhos curiosos perscrutavam pela vidraça embaçada o silêncio. Ninguém nas ruas de Pato Branco. Casas
fechadas. Durante a viagem, em cada
rodoviária, ouvia-se o rádio para saber o desenrolar dos acontecimentos. Silêncio entre os passageiros, afinal nem
sabiam o que estava acontecendo. Um comentário em voz baixa aqui, outro acolá.
Chegamos a Pranchita. Subimos o que hoje é a
rua principal arrastando as malas até a casa da “comadre Zelinda, do Russo”,
madrinha do meu irmão menor. Outra história de outro tempo que lá moramos em
1958-1960. D. Zelinda matou a fome das crianças e nos dirigimos à casa do
soldado Gilberto para pouso. Nesse tempo as pessoas eram solidárias, como D.
Zelinda que nos recebeu de surpresa. Os policiais repartiam sua casa com outros
policiais porque todos eram jogados de um lado para outro, de acordo com as
necessidades das cidades. Menos se observava as dos próprios policiais.
Assim foi nossa vida de crianças e
adolescentes. Nenhum policial da época da ditadura contestava. Apenas recebiam
ordens dos comandantes e as cumpriam.
Ninguém ousava desrespeitá-los porque sua conduta era impecável. Nada de corrupção. Um pequeno erro era cadeia
e expulsão na certa. Exalto meu pai e colegas de farda que foram policiais de
renome.
Avançando um
pouco me vejo professora aqui em Marmeleiro nesse período. Os professores tinham de buscar permissão em
Curitiba no DOPS para poder lecionar, isto é, comprovar que nenhum era
comunista e tinha ideias revolucionárias.
Professora de
Ensino Religioso nos Colégios Estaduais de Marmeleiro, inocente, moça nova,
cheia de sonhos e crenças na humanidade, ex-moradora da capital, que amava
viajar, enfim, pessoa ideal para representar os colegas. Documentos em mãos solicitados pelo DOPS que
comprovavam a idoneidade de todos, viajei.
A fila que
antecedia o DOPS dobrava quarteirões diariamente. Primeiro dia, segundo dia, terceiro dia lá
estava eu às 6 horas. Somente no quarto dia consegui entregar os documentos
para a pessoa na recepção que olhava e rabiscava as folhas com cara feia e ares
de mofa. Liberada, voltei com as cópias
em mãos que permitiam aos professores lecionar. Aqui já pensavam que eu tinha
sido abduzida pelo regime, apesar de ser filha de militar.
Ah! Esqueci-me
de dizer que só no terceiro dia alguém se dignou no DOPS separar os professores
do interior e das capitais para agilizar o procedimento e que me ofereci para
representar os colegas. O ano? Talvez, 1969. Fui estudante e professora nessa
época, mas esta é outra história.
Publicado no Jornal de Beltrão, domingo, 30.04, p.3.
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