Crônica
Ao sairmos
da sala onde houve discussão sobre o gerenciamento da família e,
consequentemente, dos filhos, percebeu-se que a tarefa ainda é árdua para
muitas mulheres, apesar de estarmos no século XXI.
Postamo-nos incrédulas, sobre o
comentário de uma delas do quanto se sentia em dificuldade para equilibrar o
trabalho que exercia fora do lar e seus “deveres de dona de casa”. Marido e
filhos não lhes davam descanso. Nada de colaboração no lar: porque homens não
podem fazer nenhuma tarefa doméstica. “Isto é coisa de mulher”, de acordo com o
marido e concepção repassada aos filhos automaticamente.
Segundo a
Psicóloga Lígia Guerra “muitas vezes a própria mulher colabora para este
conceito, pois faz distinção em casa entre as tarefas dos meninos e das
meninas”. Meninas ajudam a lavar a louça, limpar a casa, etc. Meninos ficam na
sala com o pai vendo televisão ou jogando vídeo game.
Dias atrás
um aluno me falou: “lá em casa, minhas irmãs são da mãe; eu e meus irmãos somos
do pai. - É assim pedagoga, vamos “co” pai ao futebol e pescar. A mãe vai
passear “co as” meninas no shopping e fazer as unhas. Suspirei. E empreendi uma
conversa X. Outro me disse: “Minha mãe não trabalha”. Como assim, interpelei. –
“Ela cuida da casa e faz comida”. Mais um: - “Minha mãe, não faz nada”. Só
dorme no sofá. “Nós temos que fazer o serviço”. – Verdade? Explique-me: - “Tenho
um irmão que”... bem, a mãe não consegue dormir à noite pra cuidar dele”.
Atualmente
ainda perduram “as rainhas do lar”, expressão que surgiu durante o século XVII
entre a burguesia. Resgatei-a desses
velhos tempos em que a mãe era submissa ao marido e nem tinha direito de
amamentar os filhos porque existiam as amas de leite, geralmente, negras. As escravas negras dividiam obrigatoriamente
o leite com o filho da sinhazinha. Primeiro deviam amamentar o filho da Casa
Grande, depois o seu. Enquanto isso, a sinhazinha mãe, mal via o filho. Bastava
para algumas mulheres desse tempo enfeitar os salões de festas na companhia do ” Senhor seu Marido”. É claro que muitas no decorrer da história se rebelaram.
Nessa retrospectiva trouxe a história
da mulher-mãe para o tempo em que a família é a “célula da sociedade”, conceito
empregado nos livros de Educação Moral e Cívica, 1969, em pleno regime militar.
(Em 1970, disciplina obrigatória nas 5ªs e 6ªs séries do Curso Ginasial). A mãe, batalhadora por seus direitos no
mercado de trabalho, mas, tímida e, ainda, submissa, porém responsável de
educar e ensinar os filhos - encontrava-se encarcerada -, embora já se
estivessem “queimados os sutiãs em praça pública”, e, a pílula surgira
milagrosamente como sinônimo de liberação sexual e controle da natalidade. Mais
a onda do feminismo(movimento social, filosófico e político que pregava a
libertação da mulher de padrões opressores baseados em normas de gênero causasse grande impacto e mudanças na sociedade da época, refletindo-se, inclusive, nos
dias de hoje.
Nesse desenrolar, o pai,
historicamente, figura austera cujo papel era impor sua vontade e por ordem no
lar, paralisou-se por alguns tempos, isto é, descaracterizou-se, frente a essa
nova realidade aos moldes femininos, cuja primeira onda teria ocorrido no
século XIX e início do século XX, a segunda nas décadas de 1960 e 1970 e a
terceira da década de 1990 até a atualidade. (Wikipédia. A enciclopédia livre).
Após as
reflexões históricas já conhecidas, volto à personagem submissa e sem nexo de
como conduzir a família para que a respeitassem que me fez escrever esta
crônica, e as mulheres presentes naquele espaço de discussão que se voltaram
imediatamente ao “pobre” marido, desconsiderando-o devido suas atitudes
machistas, o qual passou a ser acusado de vários adjetivos que é melhor não citá-los.
Mas, a coisa cheia de graça realmente
aconteceu quando após a fatídica reunião, cada uma compara o próprio marido com
o da outra em relação ao esposo da minha personagem. Maridos mais ou menos
maravilhosos devido a este ou aquele desempenho doméstico, eram enumerados. E
consideraram-se as bem-amadas profissionalizadas comparando-se a mulher que se
lamentou. Os risos se sucederam...
Imagine leitor, eu, solteira, no meio
de tantos risos e agraciamento das bem-
casadas aos maridos. Sorriso a meia boca, ria não sei de
quê. Na verdade uma anônima ali,
circunstancialmente. Meio sem graça,
disse-lhes:
- Meu pai quando nasci dispensou “a comadre”
que vinha dar banho em mim. Tradição esta mantida após o parto(em casa). Uma
senhora de idade banhava diariamente a criança até a mãe se recuperar.
Geralmente era convidada depois para ser madrinha, ou, então, a parteira.
- “Eu mesmo banho minha filha”... E tomou
conta da casa, da mulher e da filha, isto, em 1952.
Saí de fininho da sala, porque todas
se divertiam com seus próprios comentários sobre os cônjuges, as rainhas do
lar, as bem-amadas, resolvidas. Quem
iria dar atenção às colocações de uma mulher solteira - por opção - sobre as
qualidades de um homem – meu pai, além do seu tempo?
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